sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

"Se eu fosse outra pessoa e olhasse para mim, eu me acharia um idiota também" (Parte 2)

O perfil abaixo foi escrito originalmente em 22 de maio de 1987, por um renomado jornalista esportivo norte-americano chamado Mitch Albom e republicado no dia 21 de janeiro de 2008, no site freep.com. A tradução em inglês foi feita por mim, portanto peguem leve nas críticas.

Segue a segunda e última parte do texto.

MITCH ALBOM FLASHBACK: Bill Laimbeer é o inimigo público número 1 - exceto em Detroit
PARTE 2

E ainda há uma surpresa para Bill Laimbeer, um sentimento que -- não importa quantas vezes fale com ele -- sempre te dá a impressão de que você estava próximo a descobrir uma faceta totalmente diferente deste cara.

"Sabe, eu na verdade nem gosto muito de basquete", ele diz de repente, enquanto pega um copo de suco de laranja. "Não é divertido ir somente jogar basquete. A competição em um jogo de verdade é divertida. Mas só jogar por jogar? Isso é bobo”.

“Isiah gosta desse tipo de coisa. Eu não sou bom nisso. Tudo que esses caras fazem é firula e enrolação, correr e arremessar. Eu sou péssimo nisso. Eu preciso de árbitros".

Sim, dizem seus críticos. Ele precisa árbitros como um comediante precisa da platéia. Não há espetáculo sem ela. Este, no fim das contas, é o homem que a revista Sports Illustrated batizou de "um sucesso desastroso" e "mestre na teatralização da queda".

Mas o que Laimbeer está dizendo é que ele precisa das regras. Assim, ele pode corrompê-las.

Goste dele ou não, aqui está um jogador de habilidade limitada que descobriu até onde ele pode ir. Um patinho feio solto em uma fábrica de maquiagem. "Desde que eu não rompa as regras", ele diz.

Então qual é a desse cara? Você pode listar 100 coisas que odeia nele. Mas não se preocupe, ele vai listá-las para você. E por que alguns de nós ainda o achamos, assim, meio intrigante?

Talvez seja a idéia que o crime mais odioso é fingir que você é algo que você não é. Nisso, Bill Laimbeer é completamente inocente. Diferente da maioria de nós, ele expõe claramente seus defeitos. Suas boas qualidades, como uma bela ceroula, ficam escondidas. "Ele causa uma terrível primeira impressão", diz Steve Glassman, 34, um dono de restaurante de Cleveland e amigo de Laimbeer. "Certa vez eu o apresentei a algumas pessoas e elas saíram dizendo 'Como o cara consegue ser desse jeito?'. Mas eles não conheciam Bill. E ele não se importa, ou pelo menos diz que não se importa".

Apesar de cometer alguns exageros, Lainbeer mantém-se firmemente fiel à sua despreocupada visão de mundo. Ele não tenta enquadrar-se na decolada subcultura negra de seus colegas de NBA. Ele não tenta fazer ganhar amigos nem influenciar as pessoas.

"Você tem uma consciência?", eu lhe pergunto.

Ele pensa. "Uh... bem... a respeito de quê?"

Essa é uma resposta original.

"Ok, basquetebol", eu digo. "Você tem uma consciência enquanto joga basquetebol".

"Não".

Ele nem sequer hesitou.

"E fora da quadra?".

Agora ele hesita.

"Bem... sim... eu acho".

Nada como dar sempre o melhor de si.

Aqui vai algo que você provavelmente não saiba sobre Bill Laimbeer. Quatro anos atrás, ele e sua mulher, Chris, perderam seu primeiro filho ainda bebê. Ele nasceu prematuro, viveu dois dias, e morreu. "Nós o enterramos e demos nosso adeus", diz

Lainbeer falava, ironicamente, no aniversário da morte de seu filho.

Ele não aproveita o assunto do filho para começar um discurso de como ele é incompreendido. Poucas pessoas sequer conhecem a história, porque Laimbeer achou que não era do interesse de ninguém. Ele admite que chorou, se é que isso faz diferença. Mas neste momento ele não demonstra qualquer sentimento.

"Ele sentiu essa perda mais do que ele deixa transparecer", diz Glassman, que estava com Laimbeer no hospital naquele dia. "O tempo todo ele estava preocupado com Chris, conosco, com todos os demais. Dizia que nós não devíamos estar tristes. E deixou o resto para ele mesmo".

"Eu lembro daqueles momentos e ouço as pessoas dizendo que ele é o jogador mais problemático da Liga, e, eu não sei, simplesmente não posso juntar as duas pessoas".

E esse é o paradoxo do homem que as pessoas amam odiar. Assim que você se convence que ele é um cético egoísta dos tênis à cabeça, alguém te conta uma história. Seu torneio de golfe de caridade. Um presente surpreendente que ele pagou. Alguma coisinha simples. E você olha pra ele, desconfiado, com aquele olhar que diz eu-sei-algo-que-você-não-sabe, e você diz, "Está bem...".

"Eu não deixo as pessoas se aproximarem de mim", ele admite. "Eu sempre quero uma área de escape".

"Será por que você tem medo que descubram que o que está aí dentro não é merecedor de toda essa atenção?".

E ao invés de rir da psicologia de boteco presente em minha pergunta, ele diz calmamente, "Sim, é possível".

Mas há mais que apenas um garoto solitário e com cara de mau atrás desse uniforme número 40. Também há isso: Laimbeer é fundamental para o sucesso dos Pinstons. Olhe as estatísticas dos jogos. Isiah Thomas pode estar com a mão quente como lava ou gelada como a de um esquimó; mas com os ajustes certos, os Pinstons ainda podem vencer. Mas se Bill Laimbeer tiver uma noite ruim, else quase nunca vencem. "Os números dizem isso", diz o técnico dos Pinstos Chuck Daly.

E ainda assim isso é algo que Laimbeer raramente menciona. Seus discursos são quase sempre sobre o time, o que o time pode fazer. Seria isso um lapso de... humildade?

“Nem todos podem ser um herói e um cara legal como Isiah", ele diz. Bem, isso soa um pouco como frustração. Um pouco.

Então o que você fará sobre esse assunto? Você pode odiar esse cara ter certeza que ele é preguiçoso e cínico e um chorão e que joga pelas estatísticas e provocador, perturbador, irritante e um cuzão. Mas você não sabe tudo.

E essa estranha impressão que diz que ele talvez seja mais esperto que tudo isso faz você despedir-se de Bill Laimbeer convencido de que você realmente o compreende. E é isso mesmo que ele quer. Dê-lhe suas vaias, suas provocações. Suas uvas.

"Eu nunca serei pequeno e discreto", ele diz. "Então descobri que talvez eu posso desempenhar o papel que já está aí para mim. As pessoas não vão mudar de idéia a meu respeito. Eu posso ir ao Boston Garden durante seis anos e fazer 60 pontos todos os jogos e eles ainda vão pensar que eu era um otário. Então esqueça".

Aí vai o Sr. Popularidade para outro jogo. Quem te incomoda, baby?

Todos esperam que ele empurre, trombe, reclame e provavelmente seja eleito mais algumas vezes para o All-Star Team. Mas sabe o que eu espero? I espero algum dia acidentalmente trombar com Bill Laimbeer em algum lugar, num mercado, ou numa creche, ou em uma esquina tranqüila do Silverdome, e flagrá-lo num ate de bondade.

E eu vou fazê-lo um favor. Não vou contar a ninguém.

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