segunda-feira, 28 de julho de 2008

Diário do Draft - Parte Cinco

Uma série em dez textos
Por Gregory Dole
Originalmente publicado em TrueHoop

O canadense Gregory Dole vive no Brasil e descreve a si mesmo como "escritor freelancer, professor de inglês como segunda língua, técnico de basquete, olheiro e viajante pelo mundo". Esta é a carreira que não muito tempo atrás, levou-o profundamente de encontro com a vida de um certo "Brazilian Blur".

Na primavera e verão de 2003, antes e depois do draft da NBA, Dole foi o tradutor de Leandro Barbosa. Ao longo dos próximos dias -- francamente, na esperança de conseguir um contrato para escrever um livro (se por acaso houver algum agente ou editor por aí lendo) -- Dole estará apresentando histórias de seu período com Barbosa. A primeira história começa quando um jogador brasileiro lhe leva uma fita cassete para a sala de Dole.

***

Nós estamos em Nova York. A cidade. Na verdade, estamos longe dos limites da cidade, em um arborizado suburbio em que nada acontece. Eles nos levaram em primeira-classe, algo inédito para Leandrinho. Conforme nós sabemos, o Knicks tem um outro nível.

No treino, quem aparece é Reece Gaines e um armador magrelo da Universidade de St. Johns. Reece fala de um boato que o agente de Kirk Hinrich enlouqueceu quando soube que Leandrinho estaria no treino em Nova York e tirou seu cliente de lá.

Assistindo ao treino, contundido, está a estrela do Knicks, Antonio McDyess. Ele nos cumprimenta com seu grande sorriso. Sem dúvidas, ele está ali entre os caras mais legais da Liga.

O treino se torna uma batalha entre Leandrinho e Gaines. A terceira aposta é o garoto de St. Johns. Leandrinho está acabando com os dois. Gaines não é assim tão bom. Ele era bom na universidade, mas fora do sistema universitário, ele não impressiona. No fim das contas, ele não ficou na NBA muito tempo.

Frustrado pelo brasileiro habilidoso, Gaines começa a jogar sujo. Quando Leandrinho vai para a bandeja, Gaines o acerta forte na cintura. O treino vai bem até este ponto. Tendo machucado sua cintura outra vez, o brasileiro reduz o ritmo e se arrasta até o fim do treino. Nós deixamos o centro de treinamento cabisbaixos, principalmente Leandrinho, que leva consigo uma pilha de gelo em volta da cintura.

O problema é que ele tem outros dois treinamentos nos próximos dois dias. Eu pergunto a Leandrinho o que ele quer fazer. Sempre competitivo, a resposta é simples. "Eu quero jogar. É pra isso que eu vim para os Estados Unidos. Eu vou me esforçar. Esta é minha chance na NBA e eu não vou desistir tão fácil. É um regresso muito grande jogar no Brasil e eu não vou desistir sem lutar".

E com isso, nós entramos na nossa limosine, adiante para o aeroporto e a cidade de Memphis. No hotel em Memphis, nós dois desabamos. Mais tarde eu acordo e vou dar uma caminhada. O hotel está no mesmo prédio que um hospital para crianças com câncer. Quando tomo o elevador para o lobby, encontro uma jovem família. A criança está careca. Eu imagino o pior. Momentos como este fornecem melhores perspectivas para as dificuldades de qualquer um. Eu percebo que as coisas vão dar certo para Leandrinho. Ele é um talento incrível. Alguém na NBA vai perceber isso e vai dar-lhe uma chance, mesmo que agora ele pareça estar numa onda de azar. O fato é, as coisas poderiam estar muito piores que estão. Nós dois poderíamos estar compartindo o destino daquele garotinho no elevador.

Quando eu chego perto de voltar para o hotel, eu me perco. Tantos hotéis em tão poucos dias, eu estou desorientado. Estou no quinto andar esta noite ou no décimo-quinto? 1553 ou 1535? 513 ou 531? Eu deveria ir na recepção perguntar, mas confiante no meu senso de direção masculino, eu acredito que possa achar meu quarto por minha conta. Eu não encontro.

Uma hora depois, eu encontro.

Como descobrimos depois, os Grizzles não pagam pelo café-da-manhã, o que realmente me afeta, pois eu caprichei na primeira refeição da manhã. Quando nós chegamos ao Rhodes College, onde os Grizzlies fazem seus treinos, me deparo com uma mesa mal-organizada de café-da-manhã com pasta de amendoim, geléia e bagels. Normal, para nossos padrões, mas definitivamente baixo-nível comparado com tudo que a gente já viu nesses últimos dias. Com todo o respeito, ao lembrar que o time acaba de mudar-se para Memphis, eu tenho a sensação de que estou de volta ao Brasil. Não parece a NBA.

Eu me viro pra encontrar o fisioterapeuta do time, que mais tarde provará ser essencial para o treino de Leandrinho. Ele ouve meu sotaque e percebe que sou canadense. Ele me pergunta de onde eu sou. Eu digo Ottawa. No fim das contas ele é de perto de Renfrew County! Renfrew é uma cidadezinha próxima de onde o inventor do basquete James Naismith nasceu e cresceu. Eu destaco que fomos nós em Ottawa que inventamos o jogo e que os americanos deveriam estar agradecidos. Ele dá uma olhada para ver se alguém está ouvindo e concorda de coração. Aconteceu de ele estar com a equipe em Vancouver e então ter que mudar para Memphis. Não querendo desmerecer Memphis, porque eu adoro costelinhas e rock'n'roll, mas poucas cidades podem competir com a beleza e qualidade de vida que Vancouver oferece. Eu duvido que, tendo nascido em Ontario, este cara sequer imaginou terminar em Memphis.

O fisioterapeuta, cujo nome eu acho que era Scott, faz sua mágica. O músculo da cintura de Leandrinho está aquecido e pronto para o que der e vier. Nós vamos para a quadra. Na outra cesta, eu vejo Dwyane Wade arremessando com Troy Bell e um molecão da Universidade de Duke. Eu troco cumprimento com Bell e vou direto para Wade.

O momento que eu estava esperando.

Eu já chego intimando. "Hey. Você. Que merda vocè andou falando sobre o Leandrinho? Que você detonou ele no treino em Golden State. Você tá de brincadeira? Você enterrou uma vez em cima dele quando ele veio ajudar do lado oposto e agora você vem falar prum jornalista que você detonou no treino? Porque essa foi a única vez que você levou a melhor sobre ele."

"Essas não foram minhas palavras, cara", diz Wade. "Eu não disse isso. Eu não sei de onde essa matéria saiu. Essas não foram minhas palavras. Essas não foram minhas palavras".

O que eu posso dizer?

Eu acredito nas palavras de Wade e vou procurar um buraco para me enfiar.

O treino vai bem, na medida do possível. A cada parada no jogo, Leandrinho vai para a mesa de alongamento para alongar-se. Ele está claramente com dores. Mas ele se supera e joga bem. Ele arremessa bem. Ele defende bem. Em determinado lance ele prega um arremesso de Bell na tabela com seu cotovelo. É impressionante.

Enquanto Leandrinho dá seu melhor, o técnico Hubie Brown está muito pouco impressionado. O velhote interrompe o treino e detona as potenciais futuras escolhas do draft. "O que vocês pensam que é isso, seus panacas? Vocês pensam que são muito bons para Memphis?", ele grita. "Vocês pensam pensam que Memphis não é bom e portanto vão jogar como um bando de preguiçosos? Vocês pensam que podem vir aqui e desrespeitar a equipe técnica?". Ele continua reclamando sem parar, como apenas um velhote pode fazer. Seu linguajar não é apropriado para o TreuHoop. Muito palavrão.

Mas o discurso tem efeito. Os jogadores estão mordidos. Leandrinho não estava escutando, esperando como antes a oportunidade de ir para a mesa de alongamento mais uma vez. Não importa. Leandrinho estava levando Memphis tão seriamente como qualquer outro treino. Memphis na NBA ainda era um grande melhora em relação às ligas estaduais na terra natal, Brasil.

No final do treino, Jerry West aparece e se apresenta. "Olá, sou Jerry West", ele diz.

"Não me diga", eu penso com meus botoões.

"Diga a Leandro que ele foi abençoado por Deus".

Viro para trás e traduzo para Leandro. Ele responde em português, "Ah, certo. Hmm, que velinho gente boa."

"Ah, inclusive ele é um dos melhores da história da NBA, portanto é realmente legal ele te dizer uma coisa dessas", eu respondo numa bela risada.

Enquanto West abençoa Leandrinho, eu não posso deixar de pensar que esses treinos mostram uma pequena parte do que Barbosa pode fazer em um jogo. Se ao menos eles pudessem vê-lo jogando no Brasil no ano passado. Agora os times da NBA estão tendo uma lasca do que o garoto realmente pode fazer.

É um pensamento depressivo. Eu tenho que organizar meus pensamentos. Eu tenho mais testes psicológicos com o médico do time. Uma vez mais, a tradução dos textos demora uma eternidade. E então tem um pergunta-e-resposta com o psicólogo. Eu olho meu relógio. Estamos a ponto de perder nosso vôo para Boston. Num momento clássico durante as perguntas, Leandrinho vira pra mim e diz, "responde o que você quiser, só para parecer que nós estamos respondendo as questões, e vamos falar do tempo ou algo assim, e então você pode responder ao psicólogo".

Mentalmente exausto depois do irritante exame, corremos atrás de uma maneira de chegar ao aeroporto. Talvez nós percamos o avião.


2 comentários:

Bigode disse...

Sr Clovis,

Para de chupinhar os textos alheios e começa a meter o pau nos frangotes brasileiros que afinaram pra Olimpiada. Até o Carmelo Anthony cornetou o Nene e vc fica ai nesse tom de nao sei de nada.

Abraço!

Anônimo disse...

Vai sair a parte 6 não?
Esse lance ta massa até agora... termina ae =)

Flw